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A reparação

Há também quem lhe chame conserto, reforma, restauro. Geralmente fica caro. Pelo menos para nós que estamos sempre à espera de pagar o menos possível. Seja pelo arranjo da viatura, pela reforma do apartamento, pelo conserto do armário. Por falar em armário, aquela foi a semana em que todos dele pareceram sair, para gritar a plenos pulmões a palavra de ordem; reparação. Coisas para reparar não faltam. Países imensos, regiões inteiras, vastas comunidades. Por estes dias ouvi num dos canais de informação que costumo frequentar, uma activista que rasga em mil pedaços a bandeira do luso-tropicalismo, teoria que na verdade não passa disso mesmo, e que na criação do sociólogo brasileiro Gilerto Freyre apontava para a naturalidade e genuinidade da apetência dos portugueses pelos trópicos, e empatia pelos seus povos. Na verdade, já passamos essa fase, os acontecimentos históricos encarregaram-se de o colocar no seu devido lugar, mas de quando em vez vem à tona, sobretudo para lembrar Portugal do seu colonialismo, e de que ele continua presente na forma como olhamos para as comunidades de África, Brasil ou Timor-Leste. E portanto, no entender dos defensores da reparação, temos de pagar por esse olhar. Pagar e bem. Ou seja, em dinheiro e tesouros.

Mas afinal o que são a cooperação e a integração, senão parte dessa reparação? Seja na forma como anualmente, ou sempre que é preciso, fortalecemos os orçamentos dos Estados africanos, seja no acolhimento permanente de milhares de imigrantes. Quase um milhão de portugueses residentes, cidadãos de Portugal, nasceram em África, na Ásia, na América do Sul. Em países construídos a partir da presença portuguesa, e sim, também, do fomento do comércio de escravos. Inegável. Nasci num país colonial, e como tal na óptica dos fundamentalistas defensores de que o país muito deve pelos males que causou, sou um dos que deve obrigar Portugal a pagar. Não, não me sinto de forma alguma tentado a fazê-lo. Bem pelo contrário. Quero chegar à Cidade da Praia, a Luanda, a São Paulo, e ser recebido como alguém que fala a mesma língua, que é oriundo de um país que trata como irmãos, angolanos, brasileiros e cabo-verdianos, e que olha para a frente e vê um caminho para a construção de sociedades inclusas, solidárias, livres e democráticas. Sim, parece um pouco “naïf”, mas é desta forma que faço as contas, e oriento a minha forma de reparação.

Outros pedidos houve, para outras tantas reparações, outras formas de pagamento, como professores, agentes de segurança e militares que continuam sem “vê-lo”. Valha-nos os que vão – assim se espera – deixar de pagar as portagens. Lá está, a tão desejada reparação.

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