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Pode, pode

“Ora o deputado que demonstrou todo o seu "amor" pelo povo turco, não fez mais do que fazer da sua bancada no Parlamento, a barra da tasca”

A equipa do Benfica entrou em campo para a última jornada do campeonato em Vila do Conde. Não conseguiu melhor do que um empate, o que para os seus adeptos, sobretudo os mais fanáticos, é um resultado impensável, constitui uma afronta, relevada numa época desastrosa. Para esquecerem. Os onze jogadores escolhidos pelo treinador alemão para iniciarem o último jogo ante o Rio Ave, são provenientes de sete nacionalidades diferentes. Quatro são portugueses, um norueguês, dois argentinos, um brasileiro, um espanhol, um dinamarquês, e um… turco. Todos sabemos, bom… quem não sabia ficou a saber em mais uma divertida sessão parlamentar, que os turcos não são muito “dados” ao trabalho. É uma ideia, como tantas outras transformadas em tiradas verbais saídas de portugueses que gostam de dizer coisas. Muitas coisas. Algumas surpreendentes. Neste caso, até não se pode falar em surpresa, já que é comum ouvir portugueses encostados aos balcões das tabernas “vomitarem” atoardas para comentarem o desempenho profissional, ou o carácter pessoal de oriundos de outras paragens. Muitos deles, fanáticos adeptos deste e de outros clubes. Ora o deputado que demonstrou todo o seu “amor” pelo povo turco, não fez mais do que fazer da sua bancada no Parlamento, a barra da tasca, tal o tosco e despropositado comentário, parecendo atirado após mais um “gole” no copo de três. Na verdade, não é a Assembleia da República o espelho do nosso povo, não foram personagens como esta, eleitas para conceder os desejos populares?! Pois então não devemos achar que este ou aquele deputado não podem dizer isto ou aquilo. Por muito que custe ouvir certas coisas, podem. Mesmo. Aquilo é a Casa da Democracia, e a rapaziada expressa-se.

Voltando ao jogo, o Benfica esteve a ganhar, mas marcou apenas um golo depois de, segundo as crónicas do jogo, ter desperdiçado inúmeras oportunidades para conseguir outro resultado.  Ora, o que aconteceu foi que, Orkun Kökçü , imigrante turco no “país dos trabalhadores”, contrariando toda a lógica, mostrou trabalho e evitou que na última jornada, a sua equipa tivesse perdido. Aliás foi bem visível que o jogador da Turquia, se queixou publicamente durante a época, de que não o deixavam trabalhar. Kökçü pediu; – deixem-me trabalhar. Aos sábados, e também aos domingos! – mas nada. Só lhe deram ouvidos na parte final do campeonato, o que se revelou decisivo. Sem o trabalho de Kökçü, provavelmente o desastre teria sido ainda mais violento.

Ora quem deve ter ficado radiante com este golo do jogador do Benfica, e festejado efusivamente após ter emborcado mais uma mini, terá sido o Grande Líder do Grupo das Bojardas, também ele fanático adepto do clube onde trabalha o migrante turco. Condição aliás, que terá sido determinante no início da sua caminhada política.

Este texto foi escrito ao abrigo da Liberdade de expressão, conquistada em 25 de Abril de 1974.

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