APOROFOBIA

“Os muito ricos vão curtindo a ideia de ganhar muito dinheiro à custa de pobres estúpidos”

Na rubrica “Os Portugueses e o Mundo” inscrita na página 23 desta edição do Notícias da Covilhã, destaca-se um dos factos mais comentados nos últimos dias na sociedade portuguesa. E não se tratando da crise política em que o país mergulhou, tem tanto, tem mesmo tudo a ver com essa circunstância. Os lucros recordes registados no ano passado pelos maiores bancos, e o impacto que esse conhecimento tem nas sensações dos portugueses. Não estou a referir-me naturalmente à forma como todo esse dinheiro que a banca lucra, pode ou não contribuir para mudar realmente a vida do cidadão, não. Estou a pensar na reacção que rendimentos desta dimensão provocam tendo em conta a circunstância de se ser rico, ou de se ser pobre. E isso faz toda a diferença. Adela Cortina, uma reputada filósofa espanhola criou no início dos anos 90, um conceito a que chamou de aporofobia. E é a junção do prefixo grego aporos que significa pobre, desamparado, indigente, e do sufixo fobia, que quer dizer aversão, repulsa, preconceito. É assim como sentir desprezo pelos pobres, e que se pode manifestar de variadas formas. Uma delas é a demonstrada pelas políticas públicas. No Brasil chamam-lhe”pobrefobia”, e mais não é do que a necessidade de criar diferenças entre as formas como por exemplo o racismo ou a xenofobia se manifestam. Lá está. A percepção é diferente, conforme as pessoas têm mais ou menos recursos económicos, ou relevância social.

 

E porque é que chamo para aqui os desmesurados lucros da banca?! É evidente que este preconceito está em cada um de nós, nas nossas atitudes individuais, mas na verdade, parece óbvia a ligação de um sistema bancário que favorece amontoados de dinheiro, à situação de pobres famílias que todos os meses desesperam para pagar as contas da sua sobrevivência. Nessas contas, constam milhões de euros de prestações de créditos contraídos para se viver com alguma dignidade, e os juros que se vão acumulando à volta do pescoço do pobre precário e o asfixiam. Quando o presidente de um desses lucrativos bancos justifica o histórico aumento da riqueza, com a necessidade de apoiar as famílias, parece uma cena em que os muito ricos vão curtindo a ideia de ganhar muito dinheiro, porque é de muito dinheiro que se trata, à custa de pobres estúpidos. Os bancos portugueses parecem viciados em apostar que a cada novo ano os lucros aumentem, ao mesmo tempo que parecem crescer as desigualdades sociais. Os pobres precários não têm, na generalidade dos casos, culpa por viverem dessa forma, é todo um sistema social que não promove direitos para situações de vulnerabilidade, bem pelo contrário. É hostil, explora-o, afasta-o e coloca-o no esquecimento. Isso é aporofobia. Nestes momentos em que se instala uma crise política, deveríamos pensar como a crise é fomentada também pela fala de humanidade para resolvermos a crise em que cada um de nós vive. Poderíamos começar      por achar que os lucros que os bancos registam até podem chocar…

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