Na manhã do último sábado, 5, centenas de pessoas, de todas as idades, participaram na manifestação na Covilhã na qual exigiram a reabertura do antigo infantário Bolinha de Neve, encerrado desde 2018, para acolher as crianças que vão ficar sem resposta após o encerramento, em agosto, do Colégio das Freiras, e poder aumentar o número de vagas na cidade.
Com uma filha de quatro anos, Neuza Duarte, 45 anos, acredita que no próximo ano terá uma alternativa no ensino público pré-escolar, mas saiu à rua pelas crianças e famílias em geral que, neste momento, se veem num impasse e perspetiva “uma crise social”, caso não seja encontrada uma solução.
“Há uma grande preocupação latente, mas move-nos a esperança”, disse ao NC a professora e mãe, durante a marcha onde se liam cartazes como “O tempo urge”, “Não aceitamos a indiferença. Exigimos soluções”, “Queremos ser ouvidos” ou “Pela Reabertura do Bolinha de Neve”.
A manifestação juntou, além de políticos de todos os quadrantes, o que mereceu comentários jocosos de várias pessoas, também crianças, funcionários do Colégio das Freiras, famílias e covilhanenses que não sentem diretamente o problema, mas estão solidários.
A bebé de Renata Guerra, 30 anos, frequenta outro infantário, mas sabe da dificuldade em encontrar vaga para as crianças e antevê que “com menos uma instituição, vai ser pior”. A mãe trabalhou no Colégio das Freiras e a família juntou-se à marcha em solidariedade com as antigas colegas e para que a Covilhã tenha oferta e os pais não tenham de ficar preocupados com a perspetiva de não ter onde deixar as crianças.
“Espero que o Bolinha de Neve reabra e sinto que as pessoas não se estão a movimentar para que aconteça”, lamentou Renata, que espera que a pressão pública acelere o processo e os pais sejam tranquilizados.
Na véspera, sexta-feira, técnicos do município, da Segurança Social e representantes dos pais fizeram uma vistoria ao edifício, para perceber que obras são necessárias, e a porta-voz da Comissão de Pais, Ana Andrade, adiantou que reuniram com o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS), propriedade do imóvel, e aguardam um novo encontro e uma resposta do organismo do Estado.
Segundo a porta-voz, a solução “mais rápida” para resolver o problema passa pela proposta apresentada pelos pais de ser uma outra Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) do concelho, o Centro Social Jesus Maria José, do Dominguizo, a gerir o equipamento.
“Esta solução depende agora do parecer favorável do IGFSS, tendo a tutela manifestado disponibilidade para avançar, desde que os acordos diretos sejam formalizados com brevidade”, acrescentou.
Vítor Pereira, presidente da Câmara da Covilhã, frisou que, embora não seja “uma obrigação camarária”, o município tem procurado encontrar uma resposta e explicou que o que está em cima da mesa, depois de a alternativa estudada, a antiga Cozinha Económica, ter sido descartada, por aí não caberem todas as crianças, é que o IGFSS “ceda o edifício a título gratuito” e a autarquia pague as obras necessárias, “de algum vulto”.
“Estamos à espera dessa solução e a lutar por ela, sendo certo que a Câmara Municipal se disponibiliza a custear, a pagar as obras de adaptação, as obras necessárias”, garantiu o autarca, que afirmou que a gestão “é indiferente”, embora tenha acrescentado que preferia que “fosse uma resposta pública”, ao encontro dessa carência no concelho.
Questionado sobre os prazos, Vítor Pereira adiantou que está a ser tentada, junto da Segurança Social, que seja emitida uma licença que permita o funcionamento para “acomodar as valências mais urgentes” e que as obras sejam feitas “por fases”, salvaguardando a “comodidade e segurança” das crianças.
Os pais foram informados no início de janeiro que o Colégio das Freiras, frequentado por 165 crianças em três valências, e onde trabalham cerca de 30 pessoas, propriedade da Fundação Imaculada Conceição da Congregação das Irmãs Doroteias, vai fechar em agosto e lamentam que, passado este tempo, ainda não tenham resposta a uma solução alternativa.
A empurrar um carrinho de bebé e com um girassol na mão, João Pereira, 39 anos, considerou que o edifício de Bolinha de Neve “é a solução que parece ser mais viável”, para acolher não apenas as crianças e os funcionários, como as crianças do concelho sem vaga nos infantários.
Pai de três filhos, estranha que a resposta esteja “encravada” e manifestou o desejo de que a mobilização da população, a que se juntaram representantes de vários partidos, contribua para “o desbloqueio” da situação.
Na manifestação, em que centenas de pessoas fizeram o percurso com saída do Colégio das Freiras, paragem no Bolinha de Neve e terminou em frente à Câmara da Covilhã, outra mãe, Madalena Fazenda, 43 anos, manifestou a apreensão das famílias com a ausência de respostas.
“Este é o espaço que consegue acolher todas as crianças e tem espaço para mais. Os pais não podem deixar de trabalhar para ficarem com as crianças”, acentuou a encarregada de educação, que pede “um maior esforço” dos vários responsáveis, para ser encontrada “uma solução rapidamente”.
O presidente da União de Freguesias da Covilhã e Canhoso, Carlos Martins, sublinhou ter encetado diligências, ter estado desde o início ao lado dos pais e manifestou disponibilidade para prestar apoio caso seja necessário avançar para uma manifestação junto à residência oficial do primeiro-ministro, em Lisboa. “Não podemos parar. Esta luta é de todos”, realçou.
No gradeamento junto ao parque infantil do antigo infantário encontram-se duas faixas. Uma afixada pela Comissão de Pais do Colégio das Freiras, onde se lê “A Covilhã precisa do Bolinha de Neve. Juntos Pelo Direito à Educação” e a outra da CDU, onde se exige a reabertura e está inscrito “Aqui pode haver crianças. Rede pública de creches e infantários faz falta!”.
Em comunicado, a força política defendeu que devem ser salvaguardadas as vagas das crianças, os postos de trabalho, e sublinhou que o espaço deve ter “gestão pública”, através do município.
O Sindicato dos Professores da Região Centro disse ter sabido “com estupefação” das declarações do presidente do município e considerou que, seguindo essa lógica, o Estado está “a ser perdulário e a desbaratar o dinheiro dos nossos impostos, o dinheiro de todos nós, em vez de assumir as suas verdadeiras responsabilidades”, defendendo uma resposta pública para um concelho com muitas crianças em lista de espera.
“O SPRC continuará a afirmar e a lutar para que o Governo, seja ele qual for, atue no sentido de cumprir o caminho da Escola Pública, que é a que dá garantia de ser para todos e que a todos tem de acolher e atender nas suas especificidades”, acrescentou a organização sindical.