José Ramos Pires Manso*
O problema da desertificação humana ou despovoamento da maioria dos concelhos do País é uma evidência desde os anos 50/60 do século passado, quando os portugueses das zonas rurais, sobretudo, mas também das urbanas, decidiram emigrar para França e outros países da Europa, onde, consequência da Segunda Grande Guerra, se fazia sentir uma grande procura de mão-de -obra. Desde essa altura (anos 1960) o processo tem sido imparável e agora muitos destes municípios têm até dificuldade em sobreviver, precisando de uma reforma administrativa significativa que agrupe alguns deles. Tribunais, finanças, hospitais, e por aí fora, tendem a encerrar por falta de clientela. Mas o que fazer numa situação desta que cobre mais de 70% do território nacional?
Partindo desta realidade bem visível nas estatísticas do INE, do Eurostat e da OCDE, a primeira questão a abordar é “o que fazer para atenuar o “declínio” de concelhos pequenos (…) e outros com menos de 3000 habitantes?” A resposta a esta questão não é fácil. Entre 70 a 80% do Portugal Interior, e até de alguns pequenos concelhos, mais rurais, do litoral sofrem a razia demográfica e empresarial. O problema é, aliás, comum a outros países da velha Europa nomeadamente de Espanha, França, Itália, etc., e do Europa em geral que, a par deste esvaziamento, sofrem também de uma redução da taxa de natalidade para valores próximos de um filho por mãe, valor que está longe de permitir renovar a população e até substituir os entes falecidos nas mesmas regiões. É evidente que o desenvolvimento destes concelhos passa pela criação de empresas e de postos de trabalho ou pela criação de serviços públicos, o que, neste segundo caso, não deve acontecer, pois está-se é a assistir-se ao esvaziamento dos serviços públicos nestas terras, nomeadamente com o encerramento de escolas, de postos da Guarda Fiscal e alfândegas nas zonas de fronteira, de postos de GNR em quase todos eles, além de pequenos hospitais, tribunais, centros de saúde…
Mas atrair empresas não é fácil. Por um lado, porque o capital nacional é reduzido e normalmente vai para os grandes centros onde está o mercado consumidor dos produtos, ou onde há algum porto para exportar os bens produzidos e onde estão os eleitores que decidem as eleições e indiretamente decidem a localização das empresas quando necessitam de apoios públicos para se instalarem. Também porque há imensa concorrência entre autarquias que o disputam e que lhes oferecem vários estímulos como terrenos grátis e às vezes até instalações, isenções fiscais e financeiras e outras facilidades diversas. Por outro lado, o capital estrangeiro (IDE nas iniciais em português) é ainda mais raro e é altamente disputado por todos os países e as grandes cidades com estímulos muito importantes a surgirem de todos os lados e que frequentemente superam os que Portugal e os municípios podem oferecer. Além disso, esses dificilmente se instalam em pequenos centros, a não ser com apoios públicos altamente favoráveis. E mesmo assim duvidamos que o façam porque há problemas de oferta de mão-de -obra qualificada e muitas vezes falta até de outras infraestruturas, como colégios e universidades ou politécnicos para os filhos, redes de fibra ótica, e por aí fora.
A solução para estes concelhos passa por apoiar, como se puder, as empresas já instaladas, por ajudá-las a crescer – as que têm vontade de o fazer e têm sangue novo na liderança – por aproveitar a iniciativas agrícolas, florestais e pecuárias com a mão-de-obra e empresários locais, e também por criar lares da terceira idade para ajudar a sua imensa população idosa – por vezes mais de 70% dos habitantes locais. A este propósito, hoje as IPSS/lares da terceira idade, a par das câmaras municipais, são os maiores empregadores de praticamente todos os concelhos rurais do Interior. Mas a solução passa também, entre outros, por desenvolver o sector do turismo rural, a indústria da salsicharia ou cárnica, dos lacticínios- queijo e derivados, e outros sectores.
De facto, é conhecido um ou outro caso de sucesso, relativo, que beneficiou da criação de uma empresa mobilizadora, mas não conhecemos nenhum que tenha conseguido inverter a tendência de esvaziamento demográfico e de progresso económico, apesar de muitos o virem tentando há já bastante tempo. A verdade é que para inverter essa tendência seria necessária uma grande reforma estrutural, seriam precisos imensos fundos comunitários e/ou nacionais – públicos e privados. Para se conseguir dar a volta à situação, seria necessária uma forte discriminação positiva do Interior o que requereria imensa força política para tomar estas decisões, o que num regime como o nosso, dependente de ajudas da EU e de eleições democráticas que se repetem de 4 em 4 anos, não existe.
Mas o desenvolvimento destes concelhos também passa pela criação e dinamização de um jornal local, de uma rádio, de uma tv local, e de atuar decididamente nas redes sociais, para poder ajudar a promovê-lo. Convém, no entanto, não esquecer que a galvanização de populações muito envelhecidas também não é pera-doce, mas criar o jornal, e a rádio dará certamente uma ajuda, e isso não é complicado desde que haja vontade, associações e poder político interessados. Além disso, são necessárias mais infraestruturas para atrair gente mais jovem como filhos e netos de emigrantes, entre outros, piscinas naturais ou artificiais, polidesportivos, miniprogramas urbanos nas aldeias e vilas, incluindo lares e centros de dia. Igualmente o fortalecimento da rede de transporte para favorecer deslocações a hospitais, sede do concelho, comboios, o alargamento da rede de fibra ótica com banda larga / rede internet de forma a favorecer o teletrabalho e a atração dos trabalhadores remotos nacionais e estrangeiros, a criação de centros e redes de trabalho colaborativo (coworking), a criação de parques empresariais com terrenos a custo zero, e ainda a motivação das pessoas para participarem nas diversas atividades cívicas.
Na minha opinião, pessoa otimista, há sempre esperança. Esta é a última a morrer. Mas temos de ser realistas. Este é um processo que vai demorar décadas e que irá deixar muitas terras aflitas e até algumas abandonadas neste nosso Interior.
*Professor catedrático da UBI