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Bufos e cunhas

“O Estado, ou seja nós, nem precisa daqueles aparelhos auditivos muito em voga, para escutar como queremos, quem queremos, a que horas quisermos”

Está no nosso ADN. É uma marca do ser português. Meter uma “cunha”. Quem nunca o fez?! É algo que vem de trás, e os portugueses de uma maneira geral acham que é perfeitamente natural passar à frente dos outros por que conhecemos o “gajo” que toma conta dos processos, ou alguém que pode chegar ao tal “gajo”. E isto sabe tão bem. Podermos dizer; – “pronto, já está, foi difícil, mas consegui”. Aqui o processo, ah Kafka… tu é que a sabes toda, é coisa de amor de mãe. E como bem sabemos não tem preço. Não se mede em euros, sejam eles quarenta ou quatro milhões. Para salvar a vida das filhas, a senhora foi até ao fim do mundo, e levou com ela médicos, um secretário de estado, o filho do presidente da república, e o seu pai. Ninguém tem dúvidas, que foram “cunhas” ao mais alto nível que se meteram aqui. Parece tão evidente. Agora nós portugueses, que somos os gajos que metemos cunhas para tudo e mais alguma coisa, não podemos tratar “abaixo de cão” a mãe   das crianças, como o fizeram, de novo bem indrominados pelo pastor, muitos dos deputados da comissão de inquérito. Foram cunhas que a senhora meteu. Está mal? Está! Porque foi um país inteiro representado no seu Serviço Nacional de Saúde que as aceitou, e na verdade está-nos na massa do sangue. Temos vocação para a coisa. A mesma que temos para a actividade de bufo. Lá está, outra característica tão carinhosa, tão nossa. Quem soube aproveitá-la bem foi a PIDE, que tinha os seus bufos em cada esquina, em cada prédio, em cada fábrica ou escritório. Gente como nós, que de olhos e ouvidos bem abertos via e ouvia o que melhor convinha ao regime. Hoje, e já não é de agora, as coisas são bem mais sofisticadas.

O Estado, ou seja nós, nem precisa daqueles aparelhos auditivos muito em voga, para escutar como queremos, quem queremos, a que horas quisermos. Nem que isso seja ilegal, se não estiver judicialmente autorizado, ou pelo menos moralmente reprovável. O que interessa se estamos a violar a privacidade de um cidadão, mesmo sendo alguém que nos governa?! Ora se ainda por cima o processo, sempre o processo, é demorado, implicando um permanente “ouvidos na parede”, a coisa cheira a pidesca. É como ter um bufo na cozinha, todos os dias ao jantar. No mínimo é incomodativo. E fica caro, é mais um a comer. Como ficou bem patente nos últimos dias, há coisas que nunca mudam. As cunhas e os bufos fazem as nossas delícias, e mostram que há tanto para fazer nesta podre democracia que a cada passo parece bamboleante, enfraquecida pelas muitas dores de crescimento.

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