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“Estamos no meio do furacão e temos de estar a sorrir, como se estivéssemos na praia”

João Casteleiro, óculos na ponta do nariz, aconchegados na máscara cirúrgica, pin da instituição na lapela da bata, fala pausadamente, numa aparente tranquilidade que não permite perceber a agitação que se viveu no Centro Hospitalar Universitário da Cova da Beira (CHUCB), onde desde Março se assistiu a uma “transformação profunda” na habitual configuração dos serviços, agora organizados de forma a poder assistir doentes infectados com covid-19 em circuitos próprios, sem terem de se cruzar com os restantes utentes.

A postura do presidente do Conselho de Administração é calculada. Nestes momentos, diz, é importante as lideranças conseguirem dominar-se, tomarem decisões e transmitirem a todos os outros uma sensação de segurança, “não de ignorância, de menosprezar a realidade”. “Nós aqui estamos no meio do furacão e temos de estar a sorrir, como se estivéssemos na praia”, frisa, para citar um colega de profissão e acentuar a necessidade de “gerir as mentalidades”.

Até ao momento o CHUCB tem apenas uma pessoa internada portadora do novo coronavírus e há três recuperados tratados na unidade hospitalar.

“Tivemos quatro internamentos, temos capacidade para muito mais, porque organizámos um piso inteiro para isso.  Oxalá não seja preciso”, refere João Casteleiro, o “optimista” que afirma ter-se preparado para o pior e esperar o melhor, com a certeza de que, mesmo que as medidas de confinamento sejam aliviadas, as pessoas devem ter cautela e noção de que têm de se proteger do vírus, sem facilitar. No Centro Hospitalar, assegura, “vamos manter o mesmo rigor”.

Sorte faz parte dos números

O cenário na Beira Interior, com cerca de 180 casos confirmados, contrasta com o reduzido número de infectados na Cova da Beira, sete, um quadro sobre o qual o cirurgião considera prematuro tecer considerações. “Ainda não passou o tempo suficiente para se fazer uma análise, porque não sabemos. De um momento para o outro as coisas desequilibram-se ou equilibram-se”, adverte. “Neste momento é necessário cuidado nas análises que se fazem. No fim se verá porque é que há mais casos nuns sítios do que em outros”, acrescenta João Casteleiro.

O administrador do CHUCB está convicto, contudo, que “têm de existir vários factores implicados”, a estudar no futuro. Para além da “capacidade de reacção” ao problema, implementando medidas internas para combater a covid-19, tal como a formação feita para o reforço de procedimentos de segurança e manuseamento de materiais, é da opinião que o acaso faz parte da equação.

“Não podemos ter a veleidade de dizer que somos melhores do que os outros. Temos de ter a humildade de dizer que estamos aqui e não sabemos o conhecimento que temos desta doença, ainda muito limitado. Temos de ter cuidado, porque há factores que dependem das circunstâncias, da sorte”, enfatiza.

João Casteleiro dá o exemplo do primeiro caso surgido no hospital, um motorista de fora da região que se sentiu mal e se dirigiu à unidade de saúde mais próxima para ser assistido. “Foi alguém que vinha na A23 e parou aqui. É uma questão de contingência. Imaginemos que era um autocarro. Tínhamos tido vários casos”, exemplifica o cirurgião.

Realizados mais de 500 testes

Quando se mencionam as previsões para o futuro mais próximo, João Casteleiro parafraseia um futebolista, dizendo que prognósticos só no fim do jogo.  “O que podemos garantir é que nós temos um cuidado muito grande aqui dentro com as pessoas e com a protecção de todos nós”, vinca, apelando para que a população esteja consciente dos riscos e se proteja para os minimizar, dando como exemplo a etiqueta respiratória, o distanciamento social e a utilização de máscaras, que protege quem as usa e aos outros. “São gestos importantes que, multiplicados, evitam inúmeras infecções”.

Segundo o presidente do Conselho de Administração, já foram feitos no Centro Hospitalar mais de 500 testes à covid-19 e assevera nunca terem tido falta de material para fazer as recolhas necessárias. “Nós nunca tivemos falta de testes, também nunca tivemos excesso, mas mantivemos sempre regularmente o fornecimento, as nossas necessidades sempre foram satisfeitas”, informa, embora reconheça estarem a ser previdentes e a utilizar os materiais disponíveis com muito critério.

“É óbvio que também tem de haver um controle muito grande destas coisas. Tem de haver racionamento em razão, não em ração, temos de ter algum cuidado com o que gastamos, porque pode haver uma quebra no fornecimento”, sublinha João Casteleiro, que aproveita para agradecer a solidariedade da sociedade civil, que se tem mobilizado e oferecido desde bens alimentares a equipamento médico.

20 ventiladores e profissionais para trabalhar com eles

O CHUCB dispõe de 20 ventiladores e o administrador alerta que tem de haver gente habilitada a trabalhar com os aparelhos, uma gestão feita “a nível nacional” entre responsáveis de unidades de cuidados intensivos, para que haja “uma distribuição equitativa”, de forma a responder às necessidades. “Não vale a pena estarmos a pedir mais 50 se depois não conseguimos funcionar com eles”, adverte.

Apesar de considera que ninguém estava preparado para o actual contexto, mostra-se satisfeito com a capacidade de reacção dos profissionais e a forma como o hospital se organizou para a eventualidade de o panorama ganhar outros contornos.

Enquanto cirurgião, João Casteleiro frisa já ter vivido várias situações-limite. Na sociedade, olha para o actual contexto como o momento mais atípico, pelas consequências e pela escala mundial.

O administrador não tem dúvidas de que “os impactos financeiros vão ser a todos os níveis” e espera que os danos que o SARS-CoV-2 está a provocar no mundo sirvam “para aprendermos a dar mais valor e a gastarmos o dinheiro naquilo que é necessário”. “Já se percebeu que na Saúde vale a pena investir”, advoga.

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