Graça Rojão
Diretora executiva da Coolabora
Na história da Covilhã o processo de afirmação da indústria decorreu em paralelo com a desvalorização de artes e ofícios que faziam parte da vida e estavam associados à produção de objectos de uso quotidiano como, por exemplo, vestuário, tapetes, cestos, entre outros. Nesta tensão entre tradicional e industrial, no imaginário colectivo as fábricas ficaram associadas a um trabalho moderno e mais limpo, enquanto os saberes tradicionais foram sendo associados a atraso e subdesenvolvimento.
Hoje, na nossa região, tal como em em muitas outras partes do mundo, os trabalhos feitos à mão estão a conhecer um novo ciclo. A revalorização dos saberes-fazer ligados às manualidades têm levado ao surgimento de oficinas de costura, tricot, olaria, crochet, entre muitas outras. Se antes estes saberes eram transmitidos entre gerações, especialmente na esfera doméstica, hoje ocuparam o espaço público e passaram a ser feitos em oficinas, ateliers e encontros, rompendo com a circunscrição que o doméstico ditava.
Estes espaços têm um papel importante no reforço da coesão social porque cruzam facilmente pessoas com objetivos diversos: experimentar estilos de vida menos consumistas, recriar redes de relacionamento, expressar-se criativamente, numa diversidade fecunda e criadora de laços de comunidade, importante especialmente para as mulheres, cuja socialização e peso de tarefas domésticas que carregam leva frequentemente a um maior afastamento do espaço público. A participação nestas actividades significa prazer e realização pessoal pelas obras criadas e é uma oportunidade de expressão criativa e de relaxamento.
Estas manualidades feitas colectivamente podem ter um papel muito relevante na transformação social, opondo-se ao massivo, ao industrial e ao descartável. São trabalhos que implicam processos produtivos com baixo consumo de energia, recorrem a matérias primas locais e criam produtos duráveis. São também ferramentas de empoderamento individual e colectivo, porque comportam saberes-fazer relevantes para a vida quotidiana, salvaguardam e recriam o património, promovem uma reconexão com o passado, valorizando saberes ancestrais. Perante a crise ecológica, bem podemos afirmar que o futuro também se faz à mão.