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Madeiro já não é orgulho dos mancebos em Belmonte

Em Belmonte, há já vários anos que a Câmara premeia o melhor madeiro do concelho, de modo a que não morra. Mas tempos houve em que fazer a grande fogueira de Natal era motivo de orgulho. Hoje, é a Junta que assegura a tradição

Os prémios monetários, este ano, até cresceram. O primeiro classificado recebe 400 euros, o segundo, 300, e o terceiro, 150 euros. E até a melhor foto de um madeiro a arder viu o prémio reforçado em 100 por cento, passando o melhor retrato a ganhar 100, em vez dos anteriores 50 euros. A Câmara de Belmonte, no “intuito de manter uma tradição secular da noite de Natal”, há já alguns anos que promove um concurso de madeiros, que deverão estar prontos, dia 22, para serem avaliados por um júri. Uma medida para evitar que a tradição morra, uma vez que esta fogueira gigante era recolhida pelos mancebos (jovens que iam à inspeção militar nesse ano), algo que hoje já dificilmente acontece.

Em alguns locais, como Belmonte e Colmeal da Torre, este ano, é a União de Freguesias que segura a tradição. E noutros locais, os mancebos envolvidos são muitas vezes apoiados por associações, juntas de freguesias ou pessoas mais velhas.

Mas fazer o madeiro em Belmonte, há cerca de duas décadas atrás, não necessitava de incentivo algum. Era um orgulho dos jovens e uma espécie de competição com o ano anterior, de modo a ter uma fogueira maior que os antecessores.  “Era preciso ir buscar um freixo, que a madeira que tínhamos era pouca. E os de 1958 iam gozar connosco” conta Fernando Fontes, nascido em 1959, que sintetiza a “sã rivalidade” que mexia com esta tradição natalícia. O ex-dirigente associativo diz que o Natal lhe traz sempre boas recordações, e uma delas é a do madeiro. Dos dias em que se planeava. E dos dias em que se ia roubar lenha para o fazer. Em 1979, com 20 anos, Fontes recorda que no seu ano eram cerca de 40 os jovens na vila prontos para cumprir o serviço militar obrigatório, que era tão obrigatório quanto o madeiro. O belmontense lembra ainda as dificuldades em transportar a lenha, a ajuda de alguns empresários na cedência do transporte, e o medo de ser apanhado pela GNR, que em algumas ocasiões, acabava por fechar os olhos a estes delitos. E sobretudo, a amizade que se cultivava. “Ainda hoje, passado todo este tempo, no primeiro sábado de junho juntamo-nos em convívio para reviver episódios que marcaram a nossa vida “, garante.

Hoje, em Belmonte, é a União de Freguesias que assegura a feitura da fogueira, que já está instalada no largo do castelo. Hugo Adolfo, presidente da autarquia, lamenta que, “infelizmente, a tradição do madeiro tenha desaparecido. Se não for a Junta, não há madeiro” aponta. E recorda quando a sua geração, nascida em 1977, fez a fogueira, em 1995. Ou seja, há quase 30 anos. “Tínhamos 18 anos. Éramos os mancebos e tínhamos um orgulho enorme nisso. Eram dias de alegria, amizade e de interajuda. Depois da ida à inspeção militar, começávamos a pensar no madeiro. Não eram precisos nenhuns concursos para se fazer. Era um orgulho dizer que “este ano, fiz ou fizemos o madeiro no castelo” conta.

O autarca, de 47 anos, recorda que a Câmara emprestava uma máquina e um camião, alguns empresários cediam também transporte, e que no dia em que o madeiro chegava junto ao castelo, algumas caleiras acabavam por ser arrastadas pelos camiões, no Largo de São Pedro. Mas bastava um pedido de desculpas “e ficava tudo bem.” A lenha, alguma dada, outra “desviada”, lá chegava ao destino.

Bem mais lá atrás foi a vez de José Mariano, vereador na autarquia, realizar a famosa fogueira. Nascido em 1969, Mariano recorda que, na altura, eram cerca de 40 elementos os jovens da freguesia com idade militar. E que nessa altura o madeiro ainda era colocado, na noite de Natal, junto ao depósito da água, perto da igreja matriz. “Já na altura havia alguma dificuldade em arranjar lenha” conta, lembrando que na altura, a inspeção realizava-se durante três dias na vila, que “eram de festa. Um dia era reservado para irmos para o rio, levando a respectiva merenda “, recorda.

Joaquim Salcedas é natural de Caria, mas casou em Belmonte, e ali cumpriu a tradição. “Tinha 18 anos.  Fazer o madeiro era sempre um motivo de orgulho. A maior dificuldade, já na época, era arranjar madeira. Mas com dedicação, lá se conseguia. Eram dias vividos com muita euforia, alegria e amizade, acima de tudo” frisa. Salcedas recorda que os mancebos chegaram a ser denunciados à GNR pelo alegado roubo de um castanheiro que “que estava caído e a apodrecer”, mas a queixa não deu em nada. Hoje, olha para a tradição como algo “cada vez mais difícil de concretizar na nossa vila” admirando, contudo, “o esforço dos jovens que o tentam manter.”

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