Utilizar uma nova tecnologia de irrigação dos solos que fornece os volumes de água em função das necessidades específicas de cada árvore e ganhar assim eficiência na gestão dos recursos hídricos utilizados para a rega. Foi isto que foi feito em dois campos experimentais no Fundão, resultado de uma parceria entre a Universidade da Beira Interior (UBI) e a Câmara Municipal, no âmbito do projeto europeu MED-WET, que envolve oito entidades de cinco países.
Em Portugal, os testes e a procura de soluções foram feitos no Fundão, com cerejeiras, na Quinta Experimental do Seminário, e com pessegueiros, na Mata da Rainha.
Durante três anos, os investigadores propuseram-se melhorar a eficiência da irrigação na região mediterrânica, num contexto marcado pelas alterações climáticas e seca, introduzindo sistemas de rega inovadores e eficientes, destinados a pequenos agricultores destes territórios.
Com base numa primeira análise de eficiência comparativa, recorrendo aos dados recolhidos, ainda exploratórios, porque têm de ser densificados, com a monitorização e análise de mais períodos de verão, “os resultados são animadores”, salientou o coordenador, João Leitão.
“Os resultados são animadores, particularmente porque demonstram a versatilidade da tecnologia SLECI, podendo ser aplicada a diversas produções (cereja, uva e azeitona), bem como em contextos bastante diferenciados de solos e cenários climáticos”, sintetiza João Leitão, professor do Departamento de Gestão e Economia da UBI e investigador do NECE – Research Center in Business Sciences.
O académico explica ao NC que, em contraponto com o sistema de rega gota a gota, no caso do sistema SLECI as árvores têm de ter tempo de reação e adaptação.
Para já, tanto no caso do pêssego, como da cereja, foi possível concluir existir um “claro ganho em termos de poupança de recursos hídricos”, atendendo à subida das temperaturas médias no período verificado e os picos observados nos meses de julho e de agosto, que implicaram um aumento considerável da rega gota a gota e um volume “bastante inferior” através do método SLECI.
Na análise preliminar da produção do pêssego, percebeu-se que, com a rega gota a gota, o calibre do fruto é ligeiramente superior, mas essa diferença para a irrigação com a nova tecnologia é reduzida.
No caso da cereja, relativamente à eficiência na utilização de água para irrigação, o efeito é positivo no modelo seminormal, embora seja negativo “no modelo exponencial e na forma truncada”.
João Leitão salienta que os testes-piloto começaram a ser feitos no terreno, no Fundão, há ano e meio, e que cada local “apresenta uma combinação de gotejadores SLECI que fornecem diferentes volumes de água adaptados às necessidades específicas das árvores”.
Na fase de final de execução do projeto, está a ser dada formação a produtores agrícolas, como aconteceu esta semana no Fundão, com vista à transferência do conhecimento adquirido para o mundo dos negócios agrícolas e o projeto contempla também o desenho de negócios sustentáveis, integrando esta tecnologia de micro irrigação para agricultores em Portugal, Malta e Marrocos, países onde a solução foi testada em vinhas velhas e em olivais, respetivamente.
A tecnologia tem de inovador “o efeito autoregulador”, vinca o coordenador. “O SLECI funciona com uma pressão hidráulica baixa e a quantidade de água libertada depende de fatores como o tipo de solo e o teor de humidade do solo”, refere João Leitão.
Segundo o investigador, “o efeito autorregulador é causado pela tensão de sucção em constante mudança no solo”. “Quando o solo circundante está seco, a tensão de sucção aumenta e o sistema libertará um maior volume de água”, pormenoriza.
Esta solução explora a utilização da irrigação autorregulável, de baixa energia e à base de argila, uma técnica de irrigação subsuperficial autorregulável que utiliza a força de sucção real do solo circundante para regular a libertação de água do sistema. “A água é transferida para o solo através de elementos de argila colocados a uma determinada profundidade junto às raízes da cultura”, acrescenta João Leitão.
O coordenador destaca as vantagens de se tratar de uma solução que implica uma instalação simples, “sendo por isso facilmente adaptável a ambientes rurais, poupando água e energia, posicionando-se, deste modo, como uma tecnologia de baixo custo e facilmente integrável em sistemas de irrigação tradicionais”.
João Leitão considera o método em que têm trabalhado “uma solução promissora para a conservação da água e para uma agricultura eficiente”, acrescentando que os testes feitos em Portugal, Marrocos e Malta são um “passo significativo para a sua aplicação prática”.
“Face às alterações climáticas e ao esgotamento de recursos, o projeto MED-WET e a tecnologia SLECI oferecem soluções pragmáticas de baixo custo para promover um futuro mais sustentável e resiliente para a agricultura em regiões com escassez de água”, reforça o coordenador.
O responsável pormenoriza que foram recolhidos, semanalmente, dados relacionados com os volumes de água utilizados, as condições climatéricas, a percentagem de água no solo e frisa que a monitorização contínua é fundamental para a implementação da tecnologia SLECI, garantindo a sua eficácia em diferentes cenários agrícolas. Até ao momento, durante o processo, pontualmente foram feitas análises ao solo ao crescimento dos frutos.
O projeto entrou agora na segunda fase de recolha de dados e a apresentação pública dos resultados está prevista para outubro, durante a Feira de Inovação Agrícola do Fundão.
O município e a UBI avançaram para o projeto com o propósito de promoverem boas práticas que contribuam para atingir as 17 metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e foram as duas entidades nacionais responsáveis por fazer os testes experimentais no âmbito do MED-WET.
O projeto Europeu MED-WET (Improving MEDiterranean irrigation and Water supply for smallholder farmers by providing Efficient, low-cost and nature-based Technologies and practices), financiado pelo programa comunitário Horizonte 2020, contempla ainda duas outras tecnologias, testadas em outros países: a construção de terras húmidas, no Egipto, e o protótipo de casa solar com vertente de dessalinização, em Malta.