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O analfabeto e o fala-barato

A confrontação. Quando todas as semanas recebo uma recusa ao pretender entregar nas ruas da cidade um exemplar da edição impressa deste jornal. A resposta é sempre a mesma; “Não obrigado, não sei ler”! E na sequência “parto pedra” com estes homens e mulheres que há cinquenta anos eram jovens em idade escolar. Portugueses da minha geração que abandonaram os estudos para trabalharem a terra, porque os pais, também eles analfabetos, muitos deles pobres agricultores remediados que olhavam para os seus filhos como mais um braço de trabalho, uma alfaia agrícola. O país está cheio destes exemplos. Destes e de outros. Não se pense que a falta de instrução e inexistente acesso à educação e à cultura, é um exclusivo das pobres terras do interior. Nada disso. Encontramos um analfabetismo estrutural espalhado por vastas áreas suburbanas das grandes cidades, transversal a uma conturbada época na segunda metade dos anos setenta, quando a taxa nacional de analfabetismo rondava ainda os 25%. Houve até um Plano Nacional de Alfabetização que tinha como objectivo a “eliminação sistemática e gradual do analfabetismo”, e que visou, de certo modo, promover nos cidadãos menos preparados, uma aprendizagem alfabética, cultural e política. O analfabeto que se entende como o indivíduo que não sabe ler nem escrever, que não recebeu instrução, terá hoje uma representação social de cerca de trezentos a quatrocentos mil portugueses, quase 4% da população, o que significa uma taxa bastante superior à grande maioria dos países da Europa, incluindo a vizinha Espanha.

Ora meus caros amigos, no que diz respeito ao analfabetismo cultural e político, Portugal encontra-se numa posição muito desagradável. Basta percebermos a forma como o pais vive, na sequência da queda do governo e da convocação de eleições legislativas antecipadas. Três intensos meses que trouxeram à tona, milhares de portugueses que, por falta manifesta de instrução e de cultura política, continuam a hastear a bandeira do “orgulhosamente sós”. Sim, os mesmos, provavelmente muitos, de mais, que a 10 de Março sairão de casa tendo em mente que o seu gesto, a sua atitude, a sua decisão, assume o contributo de quem doa o dízimo ao seu pastor. Como aquele que vai à feira, e se queda embasbacado ao ouvir o “espalha-brasas” do vendedor que do alto do seu púlpito e de microfone embrulhado num ranhoso lenço, lança pregões em catadupa anunciando o melhor preço para os seus atoalhados. É isto. Nesta venda em que o país parece transformado, ganha quem tem mais lábia, quem nos leva à certa.

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