António Rodrigues de Assunção
Os Projectos Rodoviários previstos para as Beiras Alta e Baixa já estão a suscitar dúvidas, algumas críticas veladas ao Governo, e mesmo algum cepticismo quanto à sua execução. Em Dezembro último, o Presidente da Câmara de Penamacor, António Beites, intervindo numa sessão da sua Assembleia Municipal, afirmou desejar que o Governo “não deixe cair” o IC31, que está previsto ser construído entre a A23 e Monfortinho, com ligação à Extremadura espanhola. António Beites manifestou a esperança de que o Governo “não se esqueça desta acessibilidade que é um percurso rodoviário que vai ser uma porta de entrada” em Penamacor. Disse mais: tal rodovia “é fundamental e indispensável para desencravar toda esta região”.
Já no II Encontro da Aliança Territorial Norte da Extremadura e da Beira Baixa, realizada em 2024 em Castelo Branco, João Lopes, presidente da Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa, pronunciou-se acerca desta questão, salientando que a inscrição pelo Governo, no OE25, de 1 milhão de euros para a construção do IC31, é “claramente insuficiente”, como é muito insuficiente a verba prevista de 45 milhões para o total da obra. João Lopes aproveitou a presença de dois deputados pelo círculo, João Fazenda e João Neto, para os instar a que, no debate na especialidade do OE25 fizessem aumentar aquele milhão de euros, mas tal não sucedeu. Sabe-se lá porquê.
São de louvar as iniciativas dos responsáveis da Beira Baixa pela persistência e união de esforços em prol do desenvolvimento estratégico da sua região. Porém, também quero aqui sublinhar que comungo das preocupações manifestadas por António Beites e por João Lopes relativamente à execução do IC31 e também do IC6, ambos indispensáveis ao desenvolvimento destes territórios das duas beiras. A verdade é que, como afirmou há poucos dias a ex-Comissária Europeia Elisa Ferreira, há que aproveitar os Fundos Europeus que estão no terreno (PRR e Portugal 20-30), pois estes serão os últimos que afluirão a Portugal. Nem mais nem menos!
Ou seja, há fortes razões para os receios de António Beites e de João Lopes quanto à execução do IC31. E também o IC6 corre esse risco. Restará a hipótese dos Fundos do Portugal 20-30, mas para isso as forças vivas das duas beiras deverão rapidamente e antes que se faça tarde, juntar as forças para agir junto do Governo em prol dos interesses destas terras do nosso Interior. Porque depois a “torneira” fecha.
O horizonte político que se perfila à nossa frente está, porém, cheio de desafios e de riscos muito sérios. A União Europeia está mergulhada numa situação económica anémica, cheia de dívidas e com alguns países a braços com pesadas dívidas públicas, défices orçamentais e até ameaças de recessão económica como são os casos da França e da Alemanha. Acresce a isto, uma guerra que se desenrola nas suas fronteiras, que tem tido e vai continuar a ter pesados encargos financeiros e económicos para a União. Isto para não falar nas populações dos diversos países membros, cada vez mais descontentes com o rumo dos acontecimentos e com a perda de perspectivas de futuro, sempre acicatados pelas suas extremas-direitas. Por outro lado, há países do centro do Continente que batem à porta de Bruxelas à espera de entrar no clube. Ora, este alargamento, necessário e legítimo, vai ter custos para os Orçamentos da UE, que terá de abrir os cordões à bolsa como os abriu com Portugal desde 1986. Resta dizer que os países do bloco, incluindo Portugal, vão ser brevemente chamados a aumentar drasticamente os seus contributos para a NATO, o que trará consequências muito sensíveis para a manutenção dos encargos com a saúde, a educação e a segurança social. Donde virá o dinheiro, que não estica?
Portugal, com a “torneira” dos Fundos fechada, depois de 35 anos a receber milhões de milhões, vai ter aqui uma oportunidade de oiro, mas desafiante, para fazer aquilo que não cuidou de fazer antes de entrar na CEE, em 1986: estudar profundamente e debater as causas do seu atraso histórico e avançar com denodo e ambição na via do seu desenvolvimento, no quadro europeu. Os Fundos vieram com o objectivo de permitir a Portugal superar o seu atraso em relação aos países mais desenvolvidos. Hoje sabemos que está longe de o conseguir. O nosso erro foi acolher euforicamente os avultados fundos sem o trabalho prévio indispensável: olhar para si próprio e para o seu passado a fim de identificar as causas do tal atraso. A opção foi “pôr o carro à frente dos bois”: venha de lá o dinheiro e depois logo se vê.