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O novo “ouro branco” e o Interior (1)

António Rodrigues de Assunção

Ficou famosa a reiterada afirmação de que Salazar deixara o Banco de Portugal cheio de toneladas de ouro. Mas poucos, muito poucos, ousaram afirmar que uma grande parte desse ouro acumulado pelo Estado Novo proveio da África do Sul, em “paga” do envio, forçado, de milhares de moçambicanos para o trabalho naquelas Minas, um trabalho igualmente forçado, quase escravo, e miseravelmente pago. Além de que o ouro entregue a Portugal nem sequer passava por Moçambique. É esse o “ouro” deixado por Salazar, que muitos quiseram, insensatamente, enaltecer como tendo sido fruto do génio e do espírito de poupança do homem de Santa Comba.

Estamos hoje a constatar que em terras do Interior Norte e Centro de Portugal, afinal, também existe ouro, um outro tipo de ouro, é certo, mas igualmente precioso porque por ele e com ele Portugal vai poder, finalmente, ao que nos dizem os esclarecidos, inserir-se nas chamadas “cadeias de valor” do precioso minério agora descoberto. Falo aqui do Lítio, minério indispensável para as baterias dos telemóveis e dos carros eléctricos. Estas riquezas do subsolo das terras do Interior configuram uma história digna de ser contada. Basta lembrar que aqui perto, no concelho da Covilhã, ficaram famosas as Minas do Volfrâmio, minério igualmente precioso e que Salazar, com desprezo soberano pelas populações secularmente abandonadas deste nosso Interior, usou a seu bel prazer nos negócios com as potências em conflito na Segunda Guerra Mundial. Um negócio que em nada veio beneficiar estas populações. E não contente com isso, ainda mandou reprimir violentamente e prender pela PIDE e pelas forças militarizadas do seu regime todos aqueles que, achando, na sua aparente ingenuidade, que “no nosso chão mandam os que cá estão”, se aventuravam temerariamente e com recurso à necessária clandestinidade, a recolher, impelidos pela fome e a dos seus, uns poucos quilos do precioso…ouro.

Importa proclamar aqui e hoje esta verdade: nestes quase cinquenta anos de Democracia, as terras do Interior e as suas populações muito pouco beneficiaram das atenções dos Governos, tirando as “proclamações e promessas”, estas sempre necessárias, sobretudo em tempos de votos. Os resultados são como o algodão, não enganam! Mas nem mesmo os “votos” já parecem impressionar os políticos, a tal ponto já chegou a quebra demográfica – e portanto o volume de votos “caídos nas urnas” –  uma vez que é nas terras do Litoral, onde não há petróleo, nem volfrâmio nem lítio, que se encontra a massa eleitoral que gera maiorias e é por lá, por conseguinte,  que ficam os volumosos investimentos.  Não será por acaso que o lítio, tão abundante por este Interior, não vai ter honras de refinação em empresas criadas e montadas no Interior, aqui criando empregos e riqueza, no âmbito de mais do que urgentes Políticas de Fixação ( ah! grande António Sérgio!) que exigem arrojadas medidas de Investimento, público e privado, entre outras medidas igualmente urgentes.

Já está anunciado que tal ou tais fábricas serão localizadas em Sines, no Alentejo…Litoral, para onde acorrerão, possivelmente, alguns talentosos jovens quadros formados em Universidades do Interior. Ou seja, nós, aqui no Interior, estamos condenados, como sempre, à “economia da extracção”: de recursos naturais e de população com talento. Quanto à produção, essa vai para outras paragens…que proporcionam muitos votos.

Perante isto, caro leitor, o que nos é dado ver do lado dos nossos autarcas? Ao que tudo indica, preparam-se para se satisfazerem com mais umas poucas centenas de milhares de euros de compensação caídas do Governo para nos calarem. Nos últimos tempos, o Governo está a “olhar” com renovada atenção para este Interior despovoado, abandonado e secularmente esquecido. Motivo? O Lítio, o tal “novo ouro branco”. Ou seja, depois de décadas umas atrás das outras de abandono e de esquecimento e também de incúria, eis que o Governo teve um sobressalto e parece – ou finge? – olhar para nós, os do Interior, de outra maneira. Veremos, no entanto, no que isto vai dar.

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