Lembrei-me hoje deste beirão. E não foi a propósito da própria Beira, nem da região de Castelo Branco onde nasceu. Nada disso, veio-me à memória a Costa Amalfitana. Era Agosto, mês de turismo, de muitos turistas, que se fazem transportar em muitas viaturas, e transformam o já por si muito condicionado trânsito nesta região costeira italiana, num autêntico caos. O meu carro, um de tantos, em que viajava com minha irmã, descia com vagar num “pára-arranca” constante para Almafi, um dos primeiros vilarejos desta orla marítima, o que dá o nome à costa, na deslumbrante província de Salerno. A seguir a Ravello, antes de Positano, quando mais uma vez fui obrigado a colocar o freio, tipo hora de ponta na Ponte 25 de Abril. Olho para o lado, aquele painel de azulejos entra-me pelos olhos dentro, e exclamo; “Mas isto é do Cargaleiro!”- “Claro que é do Cargaleiro, oh ignorante!”- gritou-me um indignado passarinho que, entretanto, se abeirara do vidro do carro, e não percebia como um cidadão português não se lembrava de que Manuel Cargaleiro é cidadão honorário da Costa Amalfitana desde Setembro de 2017. Precisamente, pensei depois de ter enxotado o passarito.

Titulado de “Magister Civitatis Amalfie” pelo seu trabalho artístico em algumas cidades da região, fruto de uma forte ligação a Itália iniciada em 1957, ano em que recebeu uma bolsa do governo italiano, e que lhe permitiu estudar a arte da cerâmica em várias regiões do país. Amalfi e os seus íngremes penhascos no sudoeste italiano, surgiriam apenas no final do século passado, mas a relação foi de tal modo intensa, que Cargaleiro após ter ganho em Vietro sul Mare, um prémio internacional, reforçou os laços ao ponto da criação do “Museo di Ceramica Manuel Cargaleiro”, mais tarde fundação instalada em Ravello. É do ceramista português a concepção do logotipo da candidatura da região a “Capital da Cultura 2020”. Acreditem, aquela obra do mestre numa parede da descida em Amalfi, foi como que um novo impulso para contornar as curvas e contra-curvas que muito preenchidas, obrigavam a uma atenção redobrada.

“Grande Cargaleiro!” Fui pensando nos longos quilómetros seguintes, recordando como esta Beira reconhece o inegável contributo do seu pioneirismo e inovação para a arte em Portugal. Doutor Honoris Causa pela UBI em 2022, o mestre Cargaleiro tem a sua obra um pouco por todo o mundo. Se a quiserem ver na Costa Amalfitana, não o façam em Agosto.