Um destes dias, ouvi na televisão a seguinte frase que depois vi transcrita em vários meios; “O Benfica devolveu Kaboré”. Como se Kaboré fosse uma certa quantia em dinheiro que se deve, ou um par de calças que levamos para experimentar, mas que não servem. Os jogadores de futebol são devolvidos, por que não servem. Isso mesmo, não prestam, como dizem os adeptos dos clubes. Os comentadores e analistas não “rasgam tanto pano”, são mais contidos e falam em falta de integração, ou inadequação ao sistema implementado pelo treinador. Para depois rematarem com a clássica, “não entrou nas contas” do mister. E está certo, porque afinal é mesmo de contas que falamos, quando nos referimos à mercadoria que são os jogadores de futebol. Sejam guarda-redes, defesas, médios ou avançados, não negoceiam as suas vontades de jogar ali, ou acolá. São muito poucos os que o conseguem fazer. São vendidos e comprados. E há quem faça o negócio por eles. É usual ouvirmos das suas bocas, a declaração, “não sei de nada, o meu representante é que está a tratar disso”. Do negócio, lá está. Os jogadores de futebol gostam de ser comprados ou vendidos, porque na verdade, o que lhes importa, é um grosso valor na conta bancária a pensar na família, e um clube que lhes pague uma importante soma todos os meses, para que possam desenvolver o seu trabalho.
Sim, apesar de ser uma actividade que requer muito talento e criatividade, o que a eleva ao patamar de arte, é há muito tratada como uma função. E o dinheiro é que faz a bola rolar de pé para pé. Ora, a jogador comprado temos de olhar o pé, para que não nos saia um Kaboré. O sujeito feito coisa, que “nunca sabe o dia de amanhã”, porque tratando-se de uma mercadoria, não pensa, não tem querer, muito menos poder. Está quase sempre ao dispôr da sorte de um qualquer “foothunter” que veja nele um bom artigo para encaixar numa necessitada equipa, e lhe confira uma boa maquia de comissão. O mercado a funcionar, dizem os participantes do negócio. Qua afinal, somos todos nós, consumidores do fenómeno da bola. Clientes. Está assim estratificada a sociedade. Tudo se vende, nada escapa. Não serve, troca-se por outro. E assim se forma um “plantel”, denominação tantas vezes utilizada para classificar o grupo de jogadores de uma equipa, e que nos remete para os tempos feudais de um Brasil colonizado, em que o plantel era um conjunto de escravos, quase sempre negros de África, pertencente a determinado senhor, quase sempre português. Hoje, os senhores do futebol começam a fechar contratos com pais de crianças de sete e de oito anos, que um dia tornar-se-ão boa mercadoria.