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O poder anárquico

-“Fui sequestrado, não gosto de ser sequestrado, é uma coisa que me chateia!”. Pinheiro de Azevedo era marinheiro de carreira. Foi primeiro-ministro durante 10 meses numa altura, 1975, em que no país, Portugal, qualquer um poderia ter ocupado o posto. Ficou conhecido como o “almirante sem medo”, pela determinação e pela capacidade com que lidou com situações difíceis e inesperadas, como aquela em que esteve cercado por milhares de trabalhadores, em São Bento, durante 36 horas. Na sequência, comunicaria ao Presidente da República, Costa Gomes, que o seu governo entraria em greve. Onde diabo é que isto se poderia passar senão em Portugal. O governo a fazer greve?! E não era a horas extraordinárias. Não trabalhavam, simplesmente. O chefe do governo exclamou na altura: “Estamos em greve, todos estão em greve, o governo também está em greve”. Foi em 20 de Novembro de 1975, vivia-se a ressaca da revolução perpetrada no ano anterior, e as várias lutas pelos poderes que culminariam dias mais tarde, no fim do PREC – Processo Revolucionário em Curso. Era, para muitos, a estabilização do Movimento Democrático.

48 anos depois, voltamos ao estado em que ninguém se entendia. O primeiro-ministro terá sido “sequestrado” pelo Ministério Público, e algumas horas depois pôs fim ao seu governo apresentando a demissão. “Estou farto de brincadeiras”, acrescentou o almirante Pinheiro de Azevedo aos jornalistas à saída de Belém. Costa não falou à saída da Presidência, mas em “sua” casa, disse o mesmo por outras palavras. – “Não brinco mais”! Se virmos bem, este foi um ano de muitas e boas brincadeiras no governo e zonas adjacentes, e se virmos ainda melhor, elas vão continuar por mais um par de meses. Pelo menos.

Ora o poder no país remete-nos para as mensagens publicitárias de marcas cujo lema é a longevidade tipo, “Brandy Constantino, a fama que vem de longe”. Do mesmo modo, “Poder de Portugal, a brincar aos governos desde 1975!”. Como também devemos poder brincar, lembremos os anárquicos cá da terra que por estes dias devem achar que a sua “religião” atingiu a tão desejada transformação social, e tomou finalmente conta do processo político. É isso que parece, anarquia nem que seja por um dia. Os governos superando a própria ordem social por eles criada, rumo ao descalabro das organizações. Ou como diria o trotskista britânico Alan Woods, “A guerra de todos contra todos é o pilar fundamental da sociedade capitalista”.

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