Esta semana mais da nossa “normalidade” retoma passos vagarosos e repletos de precaução. Os lares abrem portas aos familiares dos utentes, desejosos de um abraço, mas sem o poderem receber.
Todos sabemos que a atenção e o carinho são para a alma como o ar que respiramos e com que mantemos vivo o corpo. E se “de velho se torna a menino”, a presença e o cuidado dos filhos ou dos sobrinhos são sem dúvida o mimo que dá vida a muitos dos nossos idosos.
É certo que nas últimas décadas surgiu uma geração de pais sem filhos presentes, por força de uma cultura da independência e autonomia levada ao extremo, alterou-se profundamente o paradigma da família. Muitos filhos, adultos se dizem, parecem manifestar alguma irritação por terem de acompanhar os mais idosos, agora frágeis, ao médico, aos laboratórios, às finanças… Irritam-se por causa dos passos lentos, pela gestão do tempo, pela incapacidade crescente de agilidade nos gestos e nas decisões.
A busca de melhores oportunidades trouxe uma geração, da década de 60/70, para a cidade e para “o estrangeiro”. Os pais ficaram órfãos de filhos muito cedo, continuando a semear as batatas que vinham buscar ao fim-de-semana. E hoje uma grande maioria desses, que já não podem com a enxada, são os que estão nos nossos lares, são os que viviam num mundo onde chegava um dicionário de 500 palavras e pouco mais.
E esses, são sem dúvida, os que não perdem esperança, mesmo que muitas vezes magoados com a ausência dos filhos ou dos sobrinhos, por quem fizeram tudo e de quem esperam quase nada.
E parece que se reverteu a situação: assim como deixaram os filhos ao cuidado de outros, os que emigravam, ou partiam para a cidade, são hoje os que são entregues aos cuidados de instituições, que assistem a família e que em tempo de pandemia a substituíram, ainda que provisoriamente. E é aí que surge a sensação de orfandade, de abandono emocional.
São tempos difíceis: porque mesmo quando um filho não está presente na vida de seus pais, a sua voz ao telefone, agora enviada pelas modernas tecnologias carrega a melodia do afeto, da saudade e da genuína preocupação, mas não substitui o abraço.
A nossa geração, a que está nos lares, também é heroica no meio desta epidemia. Habituou-se a tudo, desafiou-se a si mesma: não abraçou os netos, não teve missa, não pode sair das quatro paredes, não pode festejar a Páscoa; teve de fazer ginástica e habituar-se à convivência virtual, teve de “aturar-se” mutuamente, teve de viver com mais rigor o confinamento a que já se ia habituando, mas que a qualquer um custa aceitar.
Desde há uns anos que nasceu uma geração de ‘pais órfãos de filhos’ e que agora ficou ainda mais evidente. Será também este o tempo de curar essa orfandade valorizando a idade de quem nos vai precedendo porque, se tudo vai ficar bem, o nosso estilo de vida tem de excluir a ‘presença a troco de nada’. É hora de voltar ao “lar” para, simplesmente “abraçar e beijar pelas palavras.”
Não podia terminar esta reflexão sem manifestar o regozijo pela menção honrosa do Prémio de Jornalismo D. Manuel Falcão, atribuída pelo Secretariado Nacional das Comunicações da Conferência Episcopal da Igreja Católica. Esta menção, que celebra a respeitável idade dos 101 anos do Noticias da Covilhã, responsabiliza-nos ainda mais na missão de dar vida a este “ancião” do jornalismo que queremos que se rejuvenesça e acompanhe os tempos actuais. Contamos com os nossos leitores! Fazemos jornalismo por si, para que esteja “No Centro da informação”.