Foi ao som de um megafone novo, já que o anterior avariou devido a “tantas situações” em que foi utilizado nos últimos três anos e meio, que o presidente da Junta de Freguesia de Caria, Silvério Quelhas, apelou à população para que retire da Caixa de Crédito Agrícola as suas poupanças, o que mereceu uma estrondosa salva de palmas.
O balcão de Caria tem fecho anunciado para 31 de julho e a autarquia, no passado sábado, 7, de manhã, promoveu uma ação de rua em que apelou à assinatura de um abaixo-assinado a ser entregue, na próxima sexta-feira, 13, à administração da empresa, de modo a que esta reveja a sua decisão. Foram muitos os que assinaram a petição para evitar um fecho que, segundo o autarca, já há dois anos atrás esteve para se efetivar. “Na altura conseguimos reverter, mas desta vez o caso é mais bicudo” disse Silvério Quelhas, que já reuniu duas vezes com a administração da única instituição bancária existente na vila. Durante o protesto, o autarca elogiou a adesão da população. “Afinal Caria tem gente e o banco não está deserto” afirmou, lembrando que nestes anos de mandato já lidou com diversas situações parecidas, como o fecho dos CTT. “Mas ainda há mais algumas” anunciou, revelando que, por exemplo, o posto da GNR também esteve em risco, “mas a situação foi revertida”.
O autarca apelou também a que a população retire as suas poupanças do banco, algo que, a título pessoal, Silvério Quelhas irá fazer. “Se Caria não interessa ao banco, então o banco também não interessa a Caria” disse o autarca, debaixo de uma salva de palmas dos populares. Silvério Quelhas afirmou que as justificações dadas, de falta de rentabilidade do balcão, não convencem, até porque, lembra, o edifício onde está instalado é da própria instituição e o funcionário, “esteja lá onde estiver, é preciso pagar-lhe”. O presidente da Junta recordou a dificuldade que os mais idosos têm em se deslocar a outro local. “Estamos dependentes desta instituição” frisou, exigindo que, em Caria, tal como noutros locais do País, as pessoas tenham direito ao “mínimo exigido” no que diz respeito a alguns serviços diários.
Alberto Louro, 81 anos, reformado, também reconhece que o balcão faz falta. Cliente do mesmo, pergunta onde se poderá dirigir para ver um extrato de conta, e salienta as dificuldades com novas tecnologias. “Internet? É areia a mais para a minha camioneta” salienta, garantindo que mesmo que isso pouco adiante, já que terá que sempre ir para outro banco fora da vila, irá retirar as poupanças. “As condições serão as mesmas, mas é uma maneira de mostrar insatisfação” afirma. Sobre a garantia deixada pela Caixa de que o multibanco exterior se manterá, Alberto desconfia: “Desta seita a gente espera tudo. Como diz o Zeca Afonso, “eles comem tudo e não deixam nada”. Só querem embolsar, e o resto que se lixe” condena.
A seu lado, outro cariense, que prefere não se identificar, garante que o balcão “faz muita falta aqui”. A assegura ter lá “mais de 30 mil euros à ordem”, que vai levantar. “Vou pôr debaixo do colchão e dividir pelos filhos” conta.
António Antunes, 82 anos, reformado, é cliente “há mais de 20 anos” e caso o balcão feche, “com certeza que tirarei as minhas poupanças Se fechar, pego nas economias e ponho noutro lado.” Também ele recorda que existe muita gente que não tem idade para conduzir. “Vêm aqui levantar o dinheirinho da reforma, e agora têm que ir a Belmonte ou outro lado qualquer? A Caixa faz muita falta a muita gente” salienta.
Estela Geraldes, 67 anos, assegura que sabe movimentar tudo pela Internet, e que só não retira as poupanças porque o marido recebe pela Caixa uma reforma de França, e teria que “alterar muita papelada. Senão tirava. E acho que muita gente o vai fazer” salienta. Cliente também há diversos anos, Estela também lembra os idosos, muitos sem transporte, para se deslocarem a outras localidades, como Belmonte. “Pagar um táxi é complicado. A Caixa está num edifício que é sua propriedade, em Belmonte paga uma renda. Por isso, não justifica estarem a tirar. A fechar, que fechassem a da Belmonte” sugere. A popular recorda as constantes ameaças a fecho de serviços na vila, ultimamente. “Isto é um começo. Já nos tiraram os correios, que teve que ser a Junta a assumir. Já quiseram tirar a GNR. Vão-nos tirando tudo a pouco e pouco. E depois querem que os jovens venham para o Interior. Para quê, se não há cada nada? Nem médicos cá temos. Não somos gente? Não votamos?” pergunta.
Na vitrine do balcão da Caixa, na manhã de sábado, foram afixados cartazes com frases como “os euros falam mais alto”, “já pensaram nos nossos idosos?”, “respeito, somos uma vila pequena, não uma quinta” ou “vamos tirar o nosso dinheiro daqui”.