Pelos corredores da instituição onde entrou dois meses depois de começarem as aulas, e onde foi administrador entre 1981 e 2008, José Correia Pinheiro compara o salto dado ao longo de quase cinco décadas e para constantemente para ser cumprimentado por funcionários ou professores.
Aos 81 anos, é o único elemento vivo da Comissão Instaladora do então Instituto Politécnico da Covilhã (IPC), criado em 1973, que daria origem, em 1979, ao Instituto Universitário da Beira Interior, marco importante, ao permitir que fossem ministradas licenciaturas.
Quando recorda a perseverança da equipa dos que acompanhou, e esses tempos dos primórdios da Universidade da Beira Interior (UBI), emociona-se e a voz some-se. Foram muitos os obstáculos a ultrapassar, comenta.
Natural de Caria, formou-se em Finanças e era técnico superior no Ministério das Corporações quando se candidatou ao IPC e se tornou um dos primeiros oito funcionários, em abril de 1975. A Covilhã tinha entre oito a dez mil trabalhadores dos lanifícios e o setor, que na década seguinte entraria em declínio, já revelava dificuldades.
“A UBI foi providencial”, afirma Correia Pinheiro. De uma cidade assente na indústria têxtil, observou ao longo dos anos a Covilhã tornar-se “uma cidade de serviços”.
Os primeiros tempos foram de “um enorme entusiasmo”. “Acreditávamos que estávamos a cumprir uma missão e púnhamos todo o entusiasmo naquilo que fazíamos”, destaca. “Não imaginava o que isto viria a ser”, admite Correia Pinheiro, que viu a instituição começar com 130 alunos nos cursos de Engenharia Têxtil e Administração e Contabilidade. A maioria pessoas na vida ativa, que aproveitaram a proximidade para aprofundar os seus conhecimentos no bacharelato.
Um dos grandes feitos da criação do ensino universitário, considera o antigo administrador, foi proporcionar a muita gente sem recursos financeiros para ir estudar para Lisboa, Coimbra ou Porto poderem prosseguir estudos. A maioria, conta, era da região, muitos trabalhavam e por isso, nos primeiros anos, havia também ensino noturno, até deixarem de se inscrever alunos suficientes. Também havia vários estudantes da zona de Guimarães. Mais tarde, recorda, abriram-se os cursos de ensino de Física e de Matemática.
Uma das dificuldades foi ter um corpo docente qualificado. Muitos vieram do estrangeiro. Entre 75 e “cerca dos anos 80”, iam-se buscar ao aeródromo os professores que chegavam na sexta-feira à tarde, davam aulas no mesmo dia e no sábado e regressavam a Lisboa.
Para Correia Pinheiro, com a instituição a funcionar, houve três fases fundamentais. A primeira “assegurar instalações condignas”, depois “encontrar docentes qualificados, com doutoramento”, e mais tarde procurar que os docentes da UBI se doutorassem. Posteriormente, a aposta na investigação científica, considera.
O antigo administrador, que aponta as primeiras salas de aula, por cima dos atuais Serviços Académicos, o primeiro bar e descreve como foi sendo feita a expansão, destaca também a criação, muito mais tarde, da Faculdade de Ciências da Saúde, que compara às “lojas âncora dos centros comerciais” e potenciou o número de alunos e “até o prestígio da universidade”.
É a única construída de raiz. As restantes resultaram da reconversão de edifícios fabris desativados. No caso do polo principal, foi utilizada a figura de usucapião para a UBI ficar proprietária do antigo quartel. As restantes instalações foram planeadas, mas também fruto das circunstâncias.
“A única via em termos de expansão de edifícios era esta, porque não havia um terreno aqui perto com 40 ou 50 hectares onde fizéssemos um campus universitário”, refere Correia Pinheiro, para quem esta opção aproximou a cidade e a comunidade académica.
Com os anos a universidade e a cidade fundiram-se, tornaram-se “unha com carne”. O ex-administrador não imaginava que as instalações fossem frequentadas por tanta gente. “O sonho foi aparecendo à medida que se foi construindo”, realça, mencionando constantemente os pioneiros, como Duarte Simões ou Passos Morgado.
O ensino universitário teve desde o primeiro momento impacto na região, considera, mas “não imaginava o que isto viria a ser”, apesar de ter acompanhado as grandes transformações e o crescimento constante “em quantidade e em qualidade”.
Olhar para o passado e para o que é hoje a UBI “é como comparar o dia com a noite” e frisa que a universidade continua “a modificar a cidade em todos os aspetos”. No futuro, antevê uma instituição a crescer durante mais alguns anos, até estabilizar e dedicar-se cada vez mais à investigação científica e romper horizontes que há 50 anos não existiam.