Desde abril que mais de 600 mãos participam na construção de uma peça comunitária intitulada “Todos somos o outro”, que deverá estar concluída até à próxima sexta-feira, 20, e cujo o resultado final é dado a conhecer a 29 de junho, último dia do Wool- Festival de Arte Urbana da Covilhã, durante um almoço comunitário realizado pela organização do certame.
Este é um dos destaques do festival que arranca no próximo sábado, 21, e que durante uma semana conta com música, cinema, exposições, conferências e um conjunto de ações multidisciplinares que, segundo a cofundadora do Wool, Lara Seixo Rodrigues, trazem “intensa criação” à Covilhã.
A peça comunitária tem sido realizada em diversas freguesias do concelho, em muitas instituições (como o Centro de Atividades), e pela comunidade em geral. Para integrarem a obra, os populares tinham que pedir um “kit” para preencherem um quadrado de 30 por 30 centímetros, que se ia juntar a outros de modo a criar a obra final. Todos os quadrados terão que ser entregues até sexta-feira, 20. O objetivo, segundo Lara Seixo Rodrigues, é cada um se colocar “na pele do outro”, de modo a promover a empatia, a inclusão, o encontro e o reconhecimento. Aproximando as pessoas umas das outras. “Cada um contribui da sua forma, com a sua velocidade, com o seu espaço, para criar uma peça que é de todos” explicou já ao NC a cofundadora do Wool. “É uma ação artística que, para além do enorme desafio de tentarmos chegar a todos, nos está a dar muito prazer concretizar com tantas mãos. Já são mais de 600” adianta.
A 12ª edição do Wool ficará também marcada pela produção do maior mural de sempre na cidade, que será pintado na Avenida Frei Heitor Pinto, entre os blocos A e B. A pintura de uma parede com 455 metros quadrados, que estará dos Boa Mistura, um colectivo artístico com raízes no graffiti, nascido em Madrid no final de 2001, fundado pelos licenciados em Belas Artes Pablo Ferreiro e Juan Jaume, o artista plástico Rubén Martín de Lucas, o ilustrador Pablo Purón e o arquitecto Javier Serrano. Actualmente, estão activos Pablo Ferreiro, Pablo Purón e Javier Serrano. Segundo a organização, o termo “boa mistura” refere-se “à simbiose que existe entre eles.” E o seu trabalho desenvolve-se principalmente em espaços públicos, “compreendendo-se como um elemento transformador, capaz de criar ou alterar as relações das pessoas com o local onde vivem.” Já realizaram projetos em mais de 40 países em todo o mundo, colaborando com organizações como a ONU, Amnistia Internacional, PNUD, Greenpeace, Acção contra a Fome ou Cruz Vermelha, entre muitas outras. “Já começámos a preparação da parede para os Boa Mistura (junto do Sport Hotel) mas só iremos iniciar no dia 21 (sábado), com o momento de inauguração da nova sala expositiva do Museu da Covilhã, dedicada ao WOOL” conta Lara Seixo Rodrigues. Uma inauguração que acontece pelas 18 horas.
Para além deste, haverá ainda duas pinturas de média dimensão, no número 16 da Calçada de São Martinho, e no número 27 da Rua António Augusto Aguiar. Uma criada pela espanhola Lídia Cao, cujas obras (murais) são maioritariamente de mulheres, que, “apesar da sua expressão delicada, emanam uma grande força e tenacidade, que a artista define como feminismo” conta a organização. Que salienta que desde a primeira edição faz “questão de ter artistas mulheres, dando um palco de ação e trabalho, e garantindo a sua visibilidade.” A outra criada pelo grego Stelius Pupet, “sem dúvida um dos artistas mais originais e talentosos da actualidade” garante o Wool. “Por cá deixará a sua marca com uma fusão de técnicas tradicionais e digitais, bebendo inspiração de temas como a identidade, memória e a perceção da realidade, e convidando-nos a refletir sobre o mundo moderno” salienta a organização. Já a portuguesa Lígia Fernandes desenvolverá alguns murais de dimensão menor com a ajuda da comunidade.
Também a rua Wool, que foi uma das novidades do ano passado, irá ter continuidade, com um dia de várias atividades em pleno Centro Histórico, com artistas de rua, azulejo experimental, cianotopia, rodilhas, tatuagens, música, conversas ou jogos, entre outras.
Em termos musicais, confirmados os mini-concertos de Vasco Fazendeiro & João Semedo (terça-feira, 24), que levarão junto ao mural criado por Lidia Cao uma performance de percussão: os Má-Hora (quarta, 25), um projecto de estreia que “tropeça no hip-hop e na eletrónica”, e que atuará nas Escadas de São Silvestre, junto ao mural de Stelios Pupet; e os LX30 (quinta, 26), que atuarão junto do gigante mural dos Boa Mistura, apresentando o seu disco Parabundei, que junta o jazz à eletrónica passando por vários estilos musicais. No dia 28, António Jorge Gonçalves também atua, com um espetáculo de desenho em tempo real, da exposição de Hugo Makarov. Todos os concertos decorrem às 18:30.
O Wool tem também previsto duas residências artísticas com as cantoras Bia Maria e Surma, com espetáculos nos dias 28 e 27. Bia Maria vai trabalhar com o Coro Viés – Vozes em Intervenção, da Coolabora, e Surma prepara-se para recolher sonoridades locais para incorporar no espetáculo que vai dar no festival, numa experiência de imersão e de interação com entidades locais. Segundo Lara Seixo Rodrigues, além de se desafiar o artista a conhecer o território onde vai trabalhar, há também uma comunidade que “é acolhida e que participa numa experiência, o que espoleta o sentimento de pertença, da valorização do que é nosso, dos nossos saberes, do nosso património”.
Nestes dias, o artista Umbra também apresentará uma instalação, com recurso a manipulação de imagens, que abordará a efemeridade da arte urbana, quando na Covilhã, em alguns locais, devido a obras de requalificação de alguns edifícios, alguns dos murais produzidos em edições anteriores já desapareceram. Durante o festival é ainda estreado o documentário “Crossroads – el viaje circular de Boa Mistura”, de Dan Barreri.
Criado em 2011, o Wool é o mais antigo festival de arte urbana de Portugal, e tem como objetivos o despertar do interesse da comunidade pela cultura e arte contemporânea, em especial, a arte urbana, prestar homenagem ao território como “forma de redescoberta da sua identidade”, reabilitar áreas urbanas através da arte, tornando-a “acessível a todos, num claro ato de democratização”, envolver a comunidade em todas as intervenções e ações, “para que esta as compreendam como suas” e a construção de um roteiro de arte na cidade, “promovendo ocupação e transformação.”